quinta-feira, outubro 30, 2008

Tem dias

Tem dias em que é mais difícil ficar sem fumar. Hoje, juro, cheguei a sentir o gosto da fumaça na minha boca. Engraçado. A caminho do ponto de ônibus passei por uma banquinha de balas, onde estavam expostos alguns maços abertos para a venda a varejo. Como seria simples pegar um desses, a 30 centavos, fumar, jogar a bituca no chão e (tentar) esquecer de novo o cigarro. O difícil seria exatamente a última parte: esquecer de novo o cigarro. Não dá. Ou melhor, pra mim, não dá.

Lembro de uma passagem do livro Christiane F., em que, após a primeira desintoxicação química da heroína, ela e o namorado saem de casa e pensam no que fazer naquele momento. Dizia ela que havia como que uma linha invisível que os puxava de volta aos mesmos lugares que eles frequentavam com os outros viciados: onde havia o meio de conseguir dinheiro, onde havia a venda de heroína e onde havia o consumo da droga. Eles, apesar de estarem "limpos", permaneciam ligados ao passado, à realidade do viciado. Onde mais poderiam ir, senão de volta à rotina?

De certa forma, vejo o cigarro assim também. Existe uma espécie de fio intangível que nos relembra sensações (somente as boas), que nos relembra do vício. Ontem estive com três amigos fumantes de Marlboro Lights. Peguei um maço (pra relembrar como ele era!) e fiquei com medo do cigarro. Voltando ao assunto, penso que se fumasse um cigarro - apenas um - este fio acabaria por me trazer de volta à realidade de fumante. Particularmente hoje foi um dia em que pensei bastante no ato de fumar, observei cada fumante que vi na rua, e reafirmei minha vontade de parar e minha disposição em me manter "clean".

Passei dos 100 dias! O próximo número redondo a ser alardeado será 150 dias - redondos 5 meses. Na vez que eu fiquei mais tempo sem fumar (antes desta tentativa), voltei após 5 meses. Quando eu chegar lá novamente, portanto, igualarei o meu recorde e estarei pronto para batalhas árduas e decisivas que certamente virão.

Despeço-me com um pequeno poema:

Tem dias
Tem dias que é mais fácil me deixar levar
Tem dias que eu não me deixo ser levado
Tem dias que não consigo levantar
sem reclamar
Tem dias que acordo e ordeno que o sol não tarde em levantar
Tem dias que não aguento esperar o dia acabar
Queria é me acabar com o dia

Grande abraço a todos
K

3 comentários:

Anônimo disse...

Kare, bom dia. Essa sensação que você relata é comum e penso que todos os que deixam de fumar sentem isso. O segredo das coisas está em transformar uma sensação que deveria ser desagradável em algo que nos gratifique. Uai! Todos os que deixam de fumar em certos dias ficam se torcendo de vontade! Sabe que faz este seu humilde criado? Desafio a coisa! Venha mesmo, vontade fia-duma-égua, eu não vou fumar, desgraçada! Cadê essa fissura mixuruca? Isso é o melhor que você pode fazer, vontade-de-fumar-de-merda? Pois nem estou sentindo cócegas, sua gôta-serena! Rarará! Tiro a seriedade da coisa e resisto... se der, ainda me divirto um pouco... Trabalho no Fórum e comento com os colegas... "gente, mas estou com uma vontade de fumar, que só vendo... mas não vou pitar. Quem manda em mim sou eu, e aqui é aroeira!" Funciona. Porque resistir é preciso. Trincar os dentes e ser mais forte que isso! Ora essa! Vê lá se um pouco de erva enrolada em um papelzinho vai mandar em mim... Vê lá. Brincadeiras (nem tanto), à parte, parabéns pela marca, amigo. Fique firme. Um abraço.

Anônimo disse...

Amigo K,

O processo é assim mesmo, as vezes fico pensando como seria a primeira tragada após tanto tempo? Aquelo gosto de cinza, um certo gosto estranho e ruim, porque depois de tanto tempo sem fumar a primeira tragada, o primeiro cigarro terá exatamente este sabor, ruim e nós viciados de carteirinha o acharemos maravilhoso, um manjar dos deuses, o que sabemos hoje não ser verdade, quando estava na sua marca imaginava o seguinte: quantas horas após acordar eu não sentiria falta do cigarro ou sentiria vontade de fumar, comemorei o dia que lembrei dele somente após o almoço e celebrei com um chocolate e um café expresso e não senti a falta do danado, a vida é assim mesmo, nada é fácil, se fosse não teria graça não é mesmo?
Grande Abraço Irmão.
Vinho.

Anônimo disse...

A, esqueci de dizer que gostei muito do seu poema.